domingo, 15 de janeiro de 2017

O Conto da Mulher Brasileira - Org. Edla Van Steen

 Análise da obra: conto por conto

 

HD 41 (Anna Maria Martins)

Narrado em 3ª pessoa

Personagem principal: Doutor Horácio José Leme da Silva Dias – Executivo de sucesso, casado, pai de família e amante de várias mulheres.

Enredo: Focado na rotina do personagem principal

Linguagem: objetiva mesclada com elementos da linguagem cinematográfica.
Espaço: São Paulo, década de 70.

Apresenta duas situações:

Horácio José Leme da Silva Dias (O trator)

Uma mulher que assiste, em casa, à sua entrevista a um programa de televisão.

A importância do homem de negócio dada pela sociedade capitalista

A imagem transmitida de sucesso e poder é desconstruída pela narrativa da estressante que o empresário vive

As máscaras não são apenas para o universo profissional. Se em casa é o chefe de família, nas viagens é o mulherengo.

HD é a representação social masculina -> patriarcal, forte, viril, corajoso, voz ativa - um trator: o homem máquina. Existe um reflexo na imagem do jovem economista.

A esposa é a representação do lugar social destinado à mulher -> do lar, mãe, esposa, dependente – renuncia sua vida para ser o apoio doméstico do marido. Existe um reflexo na mulher que assiste ao programa de TV enquanto cuida do filho.

O conto estabelece, nas entrelinhas, oposição entre o masculino e o feminino

O piano (Cristina Queiroz)


Narrado em 1ª pessoa: o narrador-personagem é uma dona de casa que busca em sua memória ser dona de seus próprios desejos.

Espaço urbano

Tempo: Mescla o presente com o passado

A partir da insatisfação com a vida que leva, começa uma auto-análise

Órfã desde criança – foi criada pela tia Alice que a ameaçava por sua rebeldia

As ameaças usava seu medo de morar com tia Glória(solteirona, mesquinha, maledicente, egoísta e má)

Aprende a tocar piano (por promessa feita a sua tia, ficaria como a prima Neusa), mas mesmo assim é mandada para casa de tia Glória.

Aprende que é importante usar a máscara do bom comportamento

Rejeita Carlinhos (de quem gostava), fica com Fernando (perfumado, estabelecido, formado em direito e de relógio no bolso de colete)

Resolve lutar (piano símbolo de sua rebeldia)

Projeta Neusa como esposa perfeita para Fernando: Modelo feminino desenhado pelo patriarcalismo.

A máscara começa a desmoronar quando Fernando pede para tocar piano

Não gosta do piano, das velas, dos cravos vermelhos, de chá

Tudo era seu passado, era sua tia, a mãe morta

Mas não era sua identidade morta

Sai para a rua
Oposições presentes no texto:

Passado x Presente
Obediência x Transgressão
Vida x Morte
Indicativos da opressão do patriarcado e a busca do autodescobrimento.

Port Moresby (Dinah Silveira de Queiroz)


Narrador em Terceira pessoa

Personagem: Dorathy – mulher da classe média alta de São Paulo.

Encontra um motivo, uma razão de luta, ao ler em um jornal a notícia da troca de uma moça de 19 anos por bois, cabras, café e sal

O que agrava a troca é o fato do pai da moça ser o líder do movimento de emancipação feminina

Port Moresby é a capital da Papua Nova Guiné

O estarrecimento provocado faz com que a personagem decida-se criar um movimento contra tal fato.

Martinha (uma espécie de cunhada) entregava a vida à feitura de tapete – não deu importância ao fato – ainda ficou pensando quanto ela valeria.

O marido chega triunfante pelo sucesso dos negócios, também não dá atenção.

Com o comunicado do marido sobre uma festa na alta sociedade, animou-se. Lá começaria seu movimento.

No salão de beleza, apenas o cabelereiro lhe dá atenção. Não pela causa, mas por ela ter a “capacidade de pensar”.

Na festa ninguém dá importância, a não ser Théo, Colunista social, interessado em “carne nova”.

Em nome de “seu ideal”, entrega-se ao colunista esperando ao menos ter uma coluna publicada.

No dia seguinte: o vazio. Sem a notícia, sem ideal.

A moça de Port Moresby é a representação do lugar social das mulheres.

Alusões às personagens de Penélope, da Odisséia (Martinha) e Dorothy, da Terra de OZ (protagonista)

Os mortos não têm desejos

(roteiro de uma vida inútil) – Edla Van Steen


Narrador em 1ª pessoa – narrador-personagem: Heloísa

Intertextualidade com Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis

Linguagem: cinematográfica (roteiro – estrutura)

A narradora morta conta como viveu inutilmente – frustrações amorosa e profissional:

Pintura fracassada
Carlos (o marido) que a traía
Fábio, amor antigo irrealizado

Estrutura 16 seqüências e 9 flashbacks

Velório, a chegada das pessoas e do próprio corpo que se recusa ver.

Observa pessoas e suas conversas (reflexões)

Ao observar Fábio deseja tocá-lo, mas “Os mortos não tem desejos”

Relações e desejos dos amigos são expostos.

Nos flashbacks conta sua história desde a infância (pautada nos contos de fadas e na espera do príncipe encantado) até sua morte em acidente(onde avançou vários semáforos)

Heloísa é a típica mulher criada por uma educação romântica -> A princesa que espera seu príncipe encantado.

Porém o tempo transforma este sonho em um pesadelo de desilusão.



Aida Arouche Magnocavallo (Helena Silveira)


Narrado em terceira pessoa

Desenvolve o perfil psicológico da personagem "Ainda"

Filha de italiana, quando os italianos sofriam preconceito pela sociedade paulistana, educada em um tradicional colégio de freiras francesas.

Não se conforma com sua ascendência italiana e culpa a mãe por isso

Não se casaria com estrangeiros, apenas com o vizinho Isac, judeu, porque ele era violinista. Quando ele deixa a música ela desiste.

Deseja a morte do pai, para assim apagar sua origem, já que não se casa.

· Quando o pai morre, viVe com remorsos, pois reconhece seu valor.

Perdida a mocidade, convence a mãe abrir uma pensão que leva o nome da família (Magnocavallo)

· Buscando um modelo na sociedade, não enxergou a mãe (que enfrentou o mundo para assumir seu próprio desejo).

O que lhe restou foi a solidão, a não realização amorosa e muito arrependimento.

Lucas, Naim (Hilda Hilst)


· Narrado em primeira pessoa

· Não apresenta estrutura - aboliu os conceitos de enredo, tempo e espaço. (um único parágrafo, mas não quer dizer unidade)

· É um monólogo interior - reflexão sobre a própria existência.

· Processo descontínuo de pensamento materializado pelas palavras derramadas na narrativa.

Busca da resposta para a pergunta: quem sou eu?

· Narrar é tentar compreender a si mesmo. Em vez disso encontra-se diluído, descentralizado, fragmentado.

· Como a palavra não dá conta de mostrá-Io, a busca não termina.

· Ele é duplo: eu e o outro(Naim) seu espelho. Só se enxerga por Naim.

· A única resposta que se pode chegar é que o indivíduo é indefmíve1, indelimitável. É uma constante construção e desconstrução. É transitório e fragmentado.

· O conto representa o retrato de seu personagem.

A sra. Büchern em Lebenswald (Judith Grossmann)


· Narrado em terceira pessoa

·Personagem: Sra. Burchern - figura enigmática. e Espaço: Alemanha

· Linguagem: concisa e densa

· Enredo: Apresentado de forma hermética, com mistério e com final aberto.

A personagem incomoda os vizinhos por causa de· seus mistérios, aparência e temperamento alternados.

O que mais incomoda é a incapacidade de se definir quem é a Sra. Büchem.

Tinha como pena (expiação) o trabalho de iniciação do triste jovem ("único homem morto em Lebenswald"). Iniciar na vida -> ressuscitar.

Quando pensa que sua missão terminou em Lebenswald, encontra outro rapaz, recupera-o também, transformando-o em santo. Cheio de vida saiu de lá "mais morto do que vivo para todo o sempre".

· Assim, a protagonista pode seguir seu caminho pagando seus pecados em outro lugar.

Sra. Büchem pode representar a mulher que foge das convenções do patriarcalismo. Por isso esse ar enigmático e, de certo modo, diabólico.

Ela representa a morte e a vida.

· O conto situa a mulher no espayo do sacrificio e do exílio.

Curriculum Vitae (Julieta de Godoy Ladeira)


Narrativa: foge do padrão tradicional das narrativas comuns e das confessionais. Em terceira pessoa onisciente, impessoal, forma de registro.

· Linguagem: aproxima dos registros profissionais: objetiva, impessoal e fria.

Espaço: urbano (Vila Mariana e Ana Rosa/SP)

· O conto tenta mostrar a vida da personagem de~de a inrancia até ficar adulta.

· Por meio de datas e acontecimentos vamos conhecendo a protagonista, sua ascensão profissional/social e sua frustração emocional.

· Problemas familiares: financeiro, pega dinheiro emprestado para abrir uma firma para o pai (com intuito do mantê-lo junto da família), porém ocorre a falência e o pai vai embora.

· Assume o lugar do pai. A mãe só reclama.

Preocupada com a mãe vai adiando a possibilidade de se casar.

· Ganha reconhecimento profissional, mas vai· perdendo a sensibilidade social.

· A mãe morre - possibilidade de mudança. Deixa o emprego e faz uma viagem. Quando volta não consegue outro emprego, pois o excesso de experiência profissional atrapalha, como também lhe atrapalha a falta de experiência emocional para VIver.

· A figura da tirania materna se metaforiza na frase "Eu subjuguei. Eu tive". Em uma das vezes que sai para procurar emprego, rasga a ficha que está preenchendo e sai para se reencontrar com os arbustos que há tantos anos não vê.


As formigas (Lygia Fagundes Telles)


Narrado em primeira pessoa → uma estudante de direito.

Enredo: aproxima-se da narrativa fantástica. Centrado na reconstrução do esqueleto de um anão pelas formigas.

Clima sombrio: o velho sobrado, a dona da pensão que parece uma bruxa, o sótão, a caixa deixada pelo último inquilino.

As figuras de Grassmann → artista que ficou famoso por suas gravuras imaginativas e inventivas: viagem ao inconsciente com elementos fantásticos.

Sonhos acompanham as formigas e a reconstrução do anão.

Terceira noite: conclusão, fuga, grito → ressurreição do anão?

O conto termina em aberto, bem característico dos contos fantásticos.

Simbologia da dificuldade da mulher que busca sua independência. Seus medos, a sombra da sociedade, a situação de margem → a desistência.

A presença(não presença) da figura masculina oprimindo, encantando e aterrorizando. O cachimbo símbolo de poder(Como Paulo Honório).

A opressão provocada pela figura do anão serve como denúncia da constante opressão que as mulheres sofrem na sociedade patriarcal. Elas desistem de realizar os seus projetos de vida.


Relatório final (Márcia Denser)

Narrado em primeira pessoa

Enredo: narradora personagem tenta relatar alguns episódios ocorridos no dia 30 de dezembro de 1977.

Espaço: A cidade de São Paulo

Linguagem: erotizada e agressiva

A memória é a base para a tentativa de criação do relatório desse dia. Como só se encontra pedaços de lembranças estas, transportadas para o texto, transformando-o em fragmentário.

O gênero relatório não se estabelece, aproxima-se mais de um fluxo de consciência (vertiginoso, embriagado e intimista)

Ela narra uma aventura sexual, regada à bebida, nesse dia.

Após a confraternização da agência em que trabalha vai para um bar, conhece um estranho com quem az sexo, mas sem se satisfazer.

A narradora não sofre nenhuma dose de pudor, na verdade parece gostar desse jeito. (Diana)

O conto inverte os papéis sociais → é a mulher a atirada, a caçadora, a que bebe, a que tem o poder sexual e econômico. O homem é menosprezado, é um objeto, um impotente, um fraco.

O conto leva a duas reflexões:

a opressão sexual que as mulheres sofrem pelo homem(mulher-fruta)

o papel que algumas mulheres assumiram após a emancipação feminina, não houve ruptura de gênero, apenas a troca de papéis.


Luar no beco (Maria de Lourdes Teixeira)


Narrado em terceira pessoa

Personagem: Teresa (órfã, responsável pela mãe caduca)

Estrutura: convencional, linear dentro das partes.

Epígrafes antecipam o enredo poético do luar e posterior abandono.

O espaço da primeira parte é um beco sujo, escuro, cheio de ratos, mal freqüentado. É onde mora Teresa e sua mãe.

A feminilidade da personagem é sufocada pela necessidade do trabalho árduo para sustentar a mãe.

Metáfora sobre o som da cidade → A cidade é como uma fera no cio com seus ruídos.

Em uma noite de luar a passagem de um homem de casaca e cartola que, com educação, lhe cumprimenta, instaura nela a poesia e a paixão.

O filtro se modifica, o desejo transforma sua realidade em sonho.

Para de cuidar da casa para cuidar de si. A mãe percebe a mudança. A mulher adormecida desperta.

Na segunda parte a história se revela por inteiro. Virgolino é apresentado. Ele que resolvera se amasiar com a lavadeira D. Antônia. Consegue um emprego que o permite ficar perambulando pelas ruas fazendo propaganda, ao voltar para casa passava pelo beco. Ele era o príncipe encantado de Teresa.

Com medo por causa da idade e de perder a segurança de Dona Antônia, pára de passar no beco e devolve as sombras à vida de Teresa.


Dia 24 à noite (Myrian Campelo)


Narrado em primeira pessoa

Estruturado como monólogo interior

Linguagem: poética e amarga.

Enredo: tenta narrar a vida: cinco anos de casamento e dois ano de separação.

Composto de um único parágrafo e apresenta uma narrativa angustiante, mas bastante lúcida.

O casamento desmoronou, o cotidiano, a rotina.

O novo casamento do ex-marido. Ele antes um revolucionário, agora um burguês.

Referência ao personagem de Tristão. Ainda existe o desejo.

Visão feminina que compreende até por que foi necessária a separação.

Mulher sensata, não sofredora. Sofre, mas consegue fazer a análise dos fatos, a nova vida do ex.

As relações homem x mulher se estabelecem: “por isso cá estamos nós soltos e distantes. Como dois inimigos que mudamente se respeitam. Eu com meu amor-próprio cerzido aos poucos, enquanto seu orgulho reluz e solta chispas como um cavalo bem tratado”



A Sagrada Família (Nélida Pinõn)


Narrado em terceira pessoa → Narrador onisciente

Estrutura: faz uma espécie de paródia à família bíblica, adota o discurso bíblico como referência intertextual.

Enredo: traz, à tona, a questão da desunião familiar, dos laços sanguíneos que unem os seres humanos em sua forma mais perversa que é a destruição de cada um.

A arma de todos é a tentativa de não ceder, de não recuar, não importando o preço que se irá pagar. Na narrativa uma história ligada à herança, num duplo sentido, tanto no que diz respeito à herança de uma terra, quanto à herança genética da resistência.

Os conchavos entre a prima e o primo (os dois herdeiros) começam a ser alinhavados e não importa o quão absurdos:

A narrativa onisciente prossegue, com detalhes contundentes, a acompanhar os acontecimentos que envolvem o casal. Também não lhe escapa como a comunidade rancorosa atiça o infortúnio alheio. Durante a leitura do texto, o leitor sente como se o mundo conspirasse a favor da infelicidade.

A prima permite que o primo a possuísse e ela se engravida. Vingança consolidada: nem ela, nem ele seriam mais o herdeiro. O primo recusa-se a conhecer o inimigo. Prepara-se para a luta que irá travar. A prima tenta reverter a luta e procura aproximar pai e filho. Ele não cede; cada dia mais irado, quebra os objetos da casa.

O filho, agora o herdeiro, queixa-se do estrago que se está fazendo a seus bens. O filho não aceita a recusa do pai em enxergá-lo e coloca-se frente a ele. O pai tenta eliminá-lo, mas o filho prova-lhe que conseguia resistir.

A narradora escancara, com morbidez, as conseqüências dos relacionamentos familiares mal estruturados. Na luta, todos se animalizam, tornam-se seres obcecados e infelizes. A escrita, como a vida das personagens, é ácida e ameaçadora.



Em uso (Rachel Jardim)


Narrado em terceira pessoa → Narrador onisciente

Estrutura: texto crítico e questionador

Enredo:A protagonista desse campo é uma mulher independente e, depois da separação, tornou-se uma devoradora de homens.

Era a manhã de seu aniversário de cinqüenta anos e queria oferecer um jantar aos amigos mais íntimos. Tudo esquematizado; o único detalhe que lhe fugira ao controle era o fato de não saber fazer café, pois sempre dera aos homens de sua vida essa função. Resolveu ir em busca de uma garrafa térmica que tivesse um bonito designo

Tinha uma paixão. Gostava de ser independente e dona de seu nariz, mas nutria paixão por um homem que, aparentemente, era quase um "primitivo", segundo os olhares das amigas.

Resolvida a conseguir a garrafa, a protagonista vai a uma loja, chamada "Em uso" que ela passava por ela. Ficava perto da casa de Afonso Cavaleiro, o homem que era o seu objeto e de desejo.

Lá chegando, descobrira que a loja mudara de lugar. Já se dirigia para o local quando pára, ao seu lado, Afonso, com a mulher. Os dois demonstrando uma felicidade incrível: ela, gordinha, cabelo cortadinho com cara de esposa; ele, cabelo lavadinho e tinha o ar mais feliz do mundo.

O conto coloca em xeque, nos anos 70, a luta feminista. Vai além: será que as mulheres só estão querendo mudar de lado e, daqui para frente, querem conquistar homens que precisam ser protegidos?

O conto não fecha questão e transfere, para o leitor, uma intrigante interrogação.



Cordélia, a caçadora (Sônia Coutinho)


Narrado em segunda pessoa / primeira pessoa do plural→ Narrador alter ego da protagonista

Enredo:narra a vida de Cordélia, uma nordestina que não gostava de mudar de homem, tímida e introvertida.

Funcionária pública, à medida que a vida vai se tornando mais difícil, por bondade e por fantasia, deitava com todos os homens que lhe apareciam a frente.

Nunca fora pedida em casamento até que aparece o Sr. Tales (Papá), um advogado de 50 anos, bem posicionado na vida, e lhe pede para contar sua vida.

Ele se apaixona pela sua pobreza e se casa com ela. À medida que o tempo passa, ele torna-se cada vez mais exigente, lembra-lhe o que ele tinha representado em sua vida, e passa a cobrar-lhe rituais sadomasoquistas.

A vida de Cordélia torna-se um inferno, e ela começa a perceber o que era o casamento. Sonda a irmã, e esta lhe diz que é preciso manter as aparências.

O conto toma um rumo inesperado. Aquela narração que, no início, aparentava ser um alter ego, se assume como tal, e a narrativa passa a ser feita na primeira pessoa do plural. Cordélia casada reata a sua ligação com a Cordélia de antes do casamento e resolve seguir a sua vida. A tessitura textual mostra a mulher como um ser forte, capaz de se refazer, quando preciso for:

A porca (Tania Jamardo Faillace)


Narrado em terceira pessoa → Narrador onisciente

Estrutura: Apresenta a característica das histórias infantis → “Era uma vez um meninozinho...”

Enredo:narra a trajetória de um menininho que se sentia deslocado em seu mundo.

Tinha com os animais da casa, uma relação diferente dos irmãos. Não conseguia tratá-los como brinquedos; enxergava-os como bichos que eram.

Os dias daquela criança eram escuros e ele tinha medo de muitas coisas. Sentia-se incomodado pelos irmãos, pela mãe e pelo pai. A descoberta infantil misturada com descoberta da realidade.

Estabelece o caráter de censura ao se referir ao órgão sexual como “aquilo” → eufemismo.

Um dia, na esquina de sua casa, vira uma cena que lhe chocou: a morte da porca que sujou de sangue todos ao redor, inclusive o rosto da mãe.

As relações familiares vão se desvelando. O complexo de Édipo ganha espaço na narrativa, e, depois disso, "o menino se agachou atrás da bananeira, com muita dor em sua barriguinha. E nunca mais beijou a mãe"(p. 218)



K de know-how (Vilma Arêa)


Narrado em terceira pessoa mas com a presença intensa de diálogo entre as duas superprotetoras que se entendem de forma magistral

Estrutura: É mais uma abundância de diálogos do que uma narrativa. Tudo é indefinível e fragmentário.

Enredo: gira todo em uma referência ao título. A velha e a moça, mãe e filha", cuidam, de maneira sufocante, do filho-irmão.

A ambiguidade fica no ar, pois o leitor não tem certeza se o know-how é das mulheres, por elas acharem que sabem cuidar da vida do homem, ou se dele, que passava de mulher em mulher e não se libertava das duas que viviam intrometendo em sua vida.

O conto desvenda a vida de duas mulheres que não têm vida própria e castram o rapaz que, ao que tudo indica, não consegue driblá-las. Coloca em foco mulheres que abandonam suas próprias vidas para cuidar da vida do outro e as conseqüências que este fato acarreta.



A COISA MELHOR DO MUNDO


Narrado em primeira pessoa

Estrutura: Dividido em três fases da vida da protagonista → 1950, 1960, 1970.

Enredo:A narradora personagem constrói um texto que remonta seu percurso de vida, em companhia daquele que escolheu para marido, dos anos 50 aos anos 70.

Aos 18 anos, nos anos cinqüenta, estudavam, trabalhavam, namoravam (os dois muito inteligentes), são felizes e aguardavam o casamento. Aos 30, casados, continuam trabalhando, têm filhos, mas agora o tempo que passam juntos é menor, estão sempre cansados, mas felizes.

Aos 35, continuam casados, os filhos estão grandes, ele se tornou importante, não fica mais em casa, e ela, agora, sem trabalhar, é parte da paisagem da casa.

O conto mostra uma dimensão temporal que atravessa dos anos 50 aos anos 70. O leitor acompanha as mudanças ocorridas durante duas décadas: a conquista feminina para trabalhar fora e estudar, a participação do capital da mulher nos primeiros anos de casamento, a volta da mulher para dentro de casa para cuidar dos filhos, a ascensão econômica e social do homem, a opção das mulheres dos anos 70 de não casarem e dormirem com quem quisessem (inclusive com os casados); o fim dos sonhos.

Uma narrativa cáustica, com forte tom irônico, em que a narradora-personagem parece ter se dado conta do engodo em que se metera, pois concluíra que a "vida mais inteligente que nós, colocou cada um em seu lugar" (p.230). Cabe ao leitor se perguntar se, já na década de 70, as mulheres começavam a ter dúvidas do que se estavam chamando de libertação feminina.



A CURIOSA METAMORFOSE POP DO SENHOR PLÁCIDO


Narrado em terceira pessoa → Narrador onisciente

Estrutura: A narração se desenvolve, concomitantemente, em dois planos: no primeiro, Plácido conversa com o amigo; no segundo, conversa com a mulher.

Enredo: adentra no ambiente de trabalho de Plácido.

É um metatexto que explora os limites entre a arte e a não-arte.

Na loja de eletrodoméstico onde é gerente, o sr. Plácido e um amigo conversam e este o convida a visitar a Bienal de Arte.

Para explicar a Plácido o que é arte moderna, o amigo toma como referência a vida e o local de trabalho de Plácido.

No segundo plano, Plácido conversa com a mulher e ela conta-lhe que seu amigo morreu e lembra-lhe que ele tem de comprar o penico, para fazer exame de fezes.

Construído através de um jogo de diálogos, em que os dois planos são falsamente articulados, a tessitura textual passa a configurar-se em um excelente cenário que encena a arte

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