quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Pequena análise do poema "O Homem e sua hora" - Terceira parte da obra




Galerinha, não é uma análise, profunda, mas apenas algumas coisas pesquisadas aqui e ali e que coloco como forma de apoio para a preparação de vocês. Espero que ajude.


Como já postei anteriormente a última parte contém o poema que dá título ao livro.


Importante lembrar que quando mencionar o nome da obra em sua resposta este deve ser sublinhado O homem e sua hora e quando for o nome do poema este deve estar entre aspas “O homem e sua hora”.

Neste poema Faustino materializa a sua busca poética apresentada nas duas primeiras partes de seu livro. É como se fosse a apresentação de sua arte poética da melhor forma possível, apresentando todos os seus recursos poéticos. Abro espaço para um comentário: simplesmente fantástico esse poema.

“O homem e sua hora”possui 235 versos (na maioria decassílabos), com forte carga de intertextualidade, visitando a poética (passada e presente) e referências bíblicas para concretizar, através de um mosaico, sua "renovação da poesia".

O poema é marcado por uma dicção épica e a construção e de um eu poético heróico. Essa construção é um incansável trabalho de questionamentos sobre o seu destino, o de sua poesia e da própria humanidade.

O poema começa com expressões que remetem à ideia de marcação ou passagem do tempo que estão associadas a ideias místicas e enigmáticas, como: "ano Mais-que-bissexto", "o décimo-terceiro", "O Mais-Que-Agosto", "mais que sexta-feira" e "mais que sexta e roxa". Sobre o tempo também é importante falar que o mesmo se apresenta dinâmico, caótico e enigmático, misturando o passado, o presente e o futuro.

17                                                           Aqui,
18 Sábia sombra de João, fumo sacro de Febo,
19 Venho a Delfos e Patmos consultar-vos,
20 Vós que sabeis que conjunções de agouros
21 E astros forma esta Hora, que soturnos
22 Vôos de asas pressagas este instante.

Na passagem transcrita o eu poético visita a cidade grega de Delfos e a, também grega, ilha de Patmos em busca da sabedoria de João e para consultar o oráculo de Apolo. Tal passagem é um exemplo claro do trabalho de junção do paganismo e do cristianismo. O poeta mostra que sua poesia é como a música de Orfeu, instrumento de harmonia.

31 E no céu onde a noite rui só vemos

32 Pálidos anjos, livros e balanças,
33 Candelabros, cavalos, crocodilos
34 Vomitando tranqüilos cogumelos
35 Róseos de sangue e lava - bestas, bestas
36 Aladas pairam, à hora de o futuro
37 Fazer-se flama, e a nuvem derreter-se
38 Em cinza presente.[...]

O poema apresenta então a noite que rui sob um céu de bombas, fazendo cinzas do presente e maus presságios sobre o futuro. A imagética de Faustino nos apresenta diversos símbolos para ilustrar o caos: os anjos pálidos, as bestas aladas e crocodilos vomitando cogumelos de sangue e lava. É o anúncio de uma existência perdida em horas de pranto e batalhas sem sentido, tendo como única certeza o caminho que conduz para a morte.

Ainda discorrendo sobre a existência perdida em batalhas sem sentidos, o eu poético começa a refletir sobre Eros, o amor, que perdeu a força diante de ritos, remorsos e proibições. Questiona o sacrifício de Cristo, que para ele representa o homem em que Eros encontrou forma, mas que também encontrou a sua perdição. Novamente vemos o diálogo do paganismo com o cristianismo.

75 Herói, vê teus barões assinalados:
76 Escondem luzes feitas para arder
77 Por todo o império; e nunca se contemplam
78 Direto ao coração, antes de agir,

É possível identificar citações em grego e latim ou em modernas línguas estrangeiras, localizadas ao longo do poema, recurso destacado por Faustino no primeiro número da página “Poesia-experiência”, pelo uso que dele fez o poeta T.S. Eliot, para quem este intercâmbio de línguas constituía um fator de revitalização da literatura. Como exemplo, a referência clara a Camões, em que o eu-lírico questiona a nobreza e contesta as ações daqueles que governam com intenções excusas e não empenham na luta o coração e a virtude.

Em "O homem e sua hora" a poesia é apresentada como aquela que é capaz de resgatar o poeta e o libertar para seguir ao encontro do verbo. Mas, não antes de fazer escolhas. Então o poeta assume a luta com as palavras. E como Pigmaleão que se apaixona por Galateia, sua escultura, o poeta pede ajuda de Efesto (Vulcano) e sua esposa Afrodite para que sua nova estátua ganhe forma, corpo e beleza e possa assim ser a condutora dos homens.

131 Phanos, imagens de beleza, chagas
132 Na memória dos homens... pede a Hermes
133 Idéias que asas gerem nos tendões
134 Das palavras certeiras - logos, logos
135 Carregando de força os sons vazios -
136 Dá-lhe tu mesmo, Fabro, o mel, a voz
137 Densa, eficaz, dourada, melopaico
138 Néctar de sete cordas, musical
139 Pandora de salvar, não de perder...
140 Orfeu retesa a lira e solta o pássaro.
141 Pronta esta estátua, agora, os deuses e eu
142 Miramos o milagre: branca estátua
143 De leite, gala, Galatéia, límpida
144 Contrafação de canto e eternidade ... 


O eu poético então evoca Phanos (Fanopeia) para trazer luz e inspiração; Hemes "logos" (Logopeia) para ter conceitos e ideias; e  Fabro, a voz e musicalidade(melopeia). Afirma o eu poético que escrever poesia é trabalho que deuses e poetas devem empreender juntos. Então nasce a poesia, a Galateia de marfim. A mulher primeira que transcederá o tempo e o espaço.

E através de novos simbolos como "Usura", "Tabus" - no poema personificados - e dragões, o eu poético apresenta a poesia em sua função social de vencer os vícios e promover a paz. O passado e o futuro se conciliam e o quadro que se apresenta é a renovação do cenário poético.

O poema então passa apresentar a união de palavras e pensamentos, uso da logopeia; aliterações, uso da melopeia; e imagens atribuídas à imaginação, uso da fanopeia. Reforça a importância de se manter a essência da poesia.

187 Vai, estátua, levar ao dicionário

188 A paz entre as palavras conflagradas.
189 Ensina cada infante a discursar
190 Exata, ardente, claramente: nomes
191 Em paz com suas coisas, verbos em
192 Paz com o baile das coisas, oradores
193 Em paz com seus ouvintes, alvas páginas
194 Em paz com os planos atros do universo -

O poeta herói então ordena que a poesia, estátua Galateia, para pelo mundo pedindo-a que ensine aos homens a magia trazida no poema. Usa o exemplo de Deucalião e Pirra - que depois do dilúvio de Zeus foram os responsáveis em repovoar o mundo, usando para isso as pedras que carregavam nos ombro - para pedir que a poesia fecunde e crie novos poetas. O poeta apaixonado por sua poesia quer vê-la multiplicar-se.

223 Vênus fará de teu marfim fecunda

224 Carne que tomarei por fêmea, carne
225 Feita de verbo, cara carne, mãe
226 de Paphos, filho nosso, que outra ilha
227 Fundará, consagrada a tua música,
228 Teu pensamento, paisagem tua.
229 Ilha sonora e redolente, cheia
230 De pios templos, cujos sacerdotes
231 Repetirão a cada aurora (hrodo,
232 Hrododaktulos Eos, brododaktulos!)
233 Que Santo, Santo, Santo é o Ser Humano
234 -Flecha partindo atrás de flecha eterna -
235 Agora e sempre, sempre, nunc et semper...

Fica ao final a sugestão da perpetuação da poesia, através do tempos, dos novos poetas que virão a renová-la a cada nova criação poética. O ciclo infinito, eterno é simbolizado pelas expressões "Flecha partindo atrás de flecha eterna", "sacerdotes repetirão a cada aurora" e "Agora e sempre, sempre, nunc et semper...", marcando o continuidade de retorno e reconfiguração do passado lançado ao futuro.

A poesia prevalece... mais do que isso, a poesia transvive!!


Um comentário:

  1. Muito bom este seu blog.
    As análises que você tem apresentado são feitas com muito critério.
    Vou indicar aos meus alunos como fonte de pesquisa.
    Parabéns,
    Cristiane

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